domingo, 29 de novembro de 2009

A TECNOLOGIA NUMA PERSPECTIVA HISTÓRICO-CULTURAL

Uma técnica não se converte em uma ferramenta até que a saiba manejar e lhe aplicar a criatividade, a imaginação e o saber.

A M. Dugud (1981)

      O conhecimento compreendido como produção histórica próprio das relações sociais, sistematizado e entendido como processo sócio-cultural, oferece uma concepção de que as tecnologias são sínteses produzidas nos diferentes momentos históricos da sociedade.
      O conhecimento é um bem social – patrimônio cultural coletivo da humanidade – o homem se humaniza a partir da apropriação destes saberes que se dá através das diferentes linguagens, que são formas simbólicas de mediação materializadas nas interações sócio-culturais. A linguagem a que nos referimos, constitui-se como instrumento mediador em um processo histórico-cultural, tendo como função a organização do pensamento e a formação da consciência. Nesta perspectiva, Vygotsky (1984) afirma que a palavra é o microcosmos da consciência.
      A tecnologia entendida como uma das linguagens a que o homem se utiliza enquanto comunicação é também uma construção social a qual se realiza e se amplia historicamente, servindo para a transformação das relações sócio-econômicas e culturais.
      Segundo Marx, “a tecnologia revela o modo de proceder do homem com a natureza, o processo imediato de produção de sua vida material e assim elucida as condições de sua vida social e as concepções mentais que dela decorrem” (Marx, apud Ruy Gama, 1987, p. 208).
       As produções tecnológicas que antecedem a Revolução Industrial, partindo da pré-história, onde o homem inventou os primeiros instrumentos, eram empíricas – surgiram da prática cotidiana – relativamente simples. A maioria das pessoas detinham o conhecimento que estava incorporado a elas, pois as mesmas baseavam-se em conhecimentos, habilidades e matérias primas locais uma vez que o contato e a comunicação entre diferentes culturas quando existiam, eram precárias.
      A expansão das atividades de navegação e comércio, em especial a partir do século XV, o movimento de formação dos estados nacionais europeu, a reforma religiosa, o iluminismo, o renascimento, são fenômenos que vão criar condições materiais para a Revolução Industrial.17
Esta conjuntura acarretou para parte da Europa, expandindo-se para todo o ocidente, uma mudança conceitual de homem, relações sociais e de trabalho, que determinaram uma nova forma de pensar a educação. A reorganização da produção agora no capitalismo, transfere a base da economia centralizada na produção rural para a urbana industrial. Esta base material cria novas relações sociais consolidando o ideário liberal. O crescente aproveitamento dos conhecimentos científicos aplicados para produzir máquinas, como por exemplo, a máquina a vapor, contribuiu de forma significativa para o primeiro momento da industrialização.
      Daquele período aos dias atuais, o desenvolvimento do conhecimento científico tem contribuído para colocar em novas bases o modo de pensar e produzir inovações tecnológicas. Nesse sentido faz-se necessário refletir sobre as formas de ensinar e sobre a produção de materiais para uma educação comprometida com a superação das desigualdades, conflitos e contradições postas na sociedade, sem perder de vista a diversidade cultural. Por isso, é importante o aprofundamento das discussões sobre mudanças significativas, produzidas nas relações sociais, em cima das quais os indivíduos constróem sua subjetividade, sua capacidade de organização e entendimento destas relações, sua visão de mundo e sua cidadania.
      Contudo, o processo intelectual não é meramente subjetivo, pois este constroe-se nas mediações sociais em contexto sócio-econômico e histórico cultural concretos, daí a importância de termos claro o potencial metodológico que as inovações tecnológicas da atualidade apresentam e entendê-las como mediações instrumentais18, materializadas neste momento histórico.
      Desta forma, o uso das tecnologias na educação proporcionam novas relações de trabalho pedagógico que através da mediatização19 do professor oportuniza melhoria da qualidade social da educação.

A APROPRIAÇÃO DA TECNOLOGIA NA PRÁTICA PEDAGÓGICA

      Qualquer orientação que venha a se colocar para o trabalho junto aos alunos, ainda que eventualmente trate de aspectos específicos como, por exemplo, o uso de vídeo ou de computador, deverá ser coerente com a concepção já estabelecido para o conjunto da Proposta Curricular/SC De acordo com tal ponto de vista, as atividades mentais determinadas pelas relações sociais, implicam na compreensão de que o processo de apropriação do conhecimento ocorre ao mesmo tempo20 em que os sujeitos desenvolvem-se culturalmente. “O processo inovador expressa a capacidade do homem em transformar a natureza por meio do trabalho; a mudança tecnológica é a exteriorização desta potencialidade” (KATZ, 1995, p. 9).
      Desenvolver o Projeto Político Pedagógico, na perspectiva da Proposta Curricular, no contexto da segunda metade da década de noventa, pressupõe a incorporação das novas tecnologias como mediadoras instrumentais na construção da práxis pedagógica. Isto implica numa postura não neutra ou apolítica, de não fetichização da tecnologia, mas sim numa compreensão do seu processo histórico de produção, através da atividade de trabalho.
      Portanto, buscar o conhecimento através destas mediações instrumentais, materializadas nas tecnologias, requer uma forma de trabalho coletivo na busca da unidade-totalidade do conhecimento, no fazer pedagógico. Ao contrário do que ocorre na produção capitalista, onde a técnica está somente a serviço da reprodução do capital, as tecnologias no trabalho pedagógico devem estar a serviço da não competitividade mas de um trabalho solidário, de uma prática coletiva interdisciplinar com qualidade social, na perspectiva da transformação da sociedade.
      Ao apontarmos nesta direção como uma orientação geral para a interação com a tecnologia, estamos querendo dizer que é necessário segundo Litwin, (1997, p. 33):

... encontrar, na tarefa docente cotidiana, um sentido para a tecnologia, um para quê. Este “para quê” tem conexão com o verbo tictein, com a idéia de criação, de dar à luz, de produzir. Como docentes buscamos que os alunos construam os conhecimentos nas diferentes disciplinas, conceitualizem, participem nos processos de negociação e de recriação de significados de nossa cultura, entendam os modos de pensar e de pesquisar das diferentes disciplinas, participem de forma ativa e crítica na reelaboração pessoal e grupal da cultura, opinem com fundamentações que rompoam com o senso comum, debatam com seus companheiros argumentando e contra-argumentando, elaborem produções de índole diversa: um conto, uma enquete, um mapa conceitual, um resumo, um quadro estatístico, um programa de rádio, um jornal escolar, um vídeo, um software, uma exposição fotográfica, etc.

      Para que não sejamos acusados de ingenuidade, necessário se faz entender a educação enquanto dependente de uma sociedade marcada por interesses antagônicos, onde nem sempre há convergência sobre a necessidade de um processo educativo voltado para a construção de uma cidadania crítica, dificultando com isto, a concretização de tal propósito. Nem sempre se trata apenas de ter uma boa proposta, pois emboradesfrutemos de uma autonomia relativa no espaço escolar, existem condições objetivas que insistem em desarticular até, às vezes, diretrizes políticas declaradas em programas e projetos educacionais. Assim, a consecução de uma proposta não é apenas questão de boa vontade, mas também de muita organização e luta em prol das diretrizes que consideramos as válidas em nossa concepção política e ética.
      Vale dizer que a compreensão do binômio Educação e Tecnologia significa ter clareza que de nada adianta termos em nossas mãos a última geração de determinados artefatos tecnológicos, mas sim, ter no profissional da educação o principal ator no processo ensino-aprendizagem. Se ele deve ser problematizador, mediador, inventivo, transformador dos conhecimentos científico, histórico e culturalmente produzidos pela humanidade, deve-se também reconhecer que entre outras necessidades a capacitação deste profissional, que é agente de mudanças, tornem-se prioridades para que os objetivos educacionais sejam devidamente alcançados.
       É fundamental que a escola, o professor e o aluno, tenham clareza de quais são os fins ou os motivos21 da atividade de ensino e de aprendizagem, contextualizem seus objetivos, definam as ações e procedimentos necessários para a consecução desses fins e considerem os objetos ou recursos disponíveis (tecnologias) para o trabalho escolar, partindo de uma análise crítica da realidade, criando condições para a formação da consciência crítica comprometida com a transformação da sociedade.

Referencias

ACESSO: Revista de informação e informática/Centro de Informática Educacional, Fundação para o desenvolvimento da educação - Ano 1 nº 2 (jul /dez. 1988) - São Paulo: FDE, 1988

ACESSO: Revista de informação e informática/Centro de Informática Educacional, Fundação para o desenvolvimento da Educação - Ano 4 (dez. 1993) - São Paulo: FDE, 1993.

KAWAMURA, Lili. Novas tecnologias e educação. São Paulo: Editora Ática, 1990.

LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. O futuro pensamento na era da informática. Rio de Janeiro, Editora 34, 1993.

LIGUORI, Laura M. As novas tecnologias da informação e da comunicação no campo dos velhos problemas e desafios educacionais. 1995

LION, Carina Gabriela. Mitos e Realidades na Tecnologia Educacional. In Tecnologia educacional - Edith Litwin (org) 1995.

RATTER, Henrique. Informática e sociedade. São Paulo; Editora Brasiliense. 1985.

SOARES, Ismar de Oliveira “A Comunicação Social no Currículo de 1º e 2º Graus.” In: IDÉIAS, nº 9 – São Paulo: FDE

TOFFLER, Alvin. A terceira onda. (Tradução João Távora) 14ª edição. Rio de Janeiro: Distribuidora Record de Serviços de Imprensa S. A., 1980.

VYGOTSKY, L.S A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. S.P.,Martins Fontes1989, cap. 6.
___________, Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fonte, 1984

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